Talvez porque desde miúda convivi excessivamente com
médicos, doenças e hospitais, ou talvez porque sou mesmo assim, dentro dos
níveis básicos da sensatez, sempre evitei, o mais possível, ir a médicos ou
valorizar doenças.
Claro que a vida, com o seu peculiar sentido de humor,
continuou a obrigar-me a frequentar hospitais e a conviver com médicos, mas, na
larga maioria dos casos, não tanto por mim mas pelos outros, família e amigos.
HISTÓRIA UM
Era verão e fui de férias para o Algarve, correu tudo
bem, ainda que tenha andado coxa o tempo todo.
É que eu, nos meus vinte e poucos anos, já tinha
osteófitos (bicos de papagaio) nos joelhos e, de vez em quando, ficavam
rabugentos, felizmente, era à vez, caso contrário devia ter que andar aos
saltinhos.
As férias no Algarve terminaram e fui para o meu
Alentejo, aproveitar mais uns dias.
Nas praias a que vamos habitualmente, no Alentejo,
somos sempre um grupo grande e naquela altura não foi exceção. A certa altura,
fomos, só as mulheres, tomar banho, enfrentando as grandes ondas, próprias das
marés vivas. Mas elas, as ondas, estavam de má catadura, pelo que, pouco
depois, fomos todas enroladas por uma onda maior.
Eu perdi a noção de onde era o céu e a terra, tantas e
tão rápidas foram as voltas que a onda me deu. Mas, às tantas, o mar já
enfastiado de mim, atirou-me, sem cerimónia, num voo descontrolado para terra.
Aterrei violentamente com os joelhos na areia e senti
uma dor lancinante nos mesmos. Mas, para meu grande espanto, quando finalmente
me consegui pôr em pé, a outra dor tinha desaparecido e ao dar os primeiros
passos verifiquei que já não coxeava.
Então, percebi que aquela tresloucada aterragem de
joelhos tinha partido os “bicos de papagaio”. Os ditos faleceram na hora e,
aparentemente, não se tinham reproduzido, pois, passados mais de trinta anos,
nunca mais nenhum me “picou”.
HISTÓRIA DOIS
Alguns anos mais tarde, tinha o meu filho mais novo
nascido há menos de um mês, acordei com uma violenta dor de rins.
O meu “defunto” (ex) marido já tinha saído para o
trabalho e eu, a custo, lá me fui desenvencilhando com um bebé recém-nascido e
uma filha de quatro anos, até porque como não conseguia estar deitada, a rotina
das manhãs ficou inalterada, incluindo o dar o banho ao bebé.
Mas, a certa altura, decidi ligar para os meus sogros,
para os pôr ao corrente da situação e para lhes pedir ajuda para poder ir ao
médico.
Os meus sogros chegaram depois de almoço. O meu sogro
entrou de semblante carregado, como se tivesse acontecido, no mínimo, uma
tragédia familiar. Acho que já me imaginava hospitalizada e o meu pobre filho
abandonado, nos avós, claro.
Pouco depois, saí com o meu sogro para ir ao médico.
Nessa altura, as ruas do local em que vivia pareciam ter sido palco de um
bombardeamento, repletas de “crateras”, onde era quase impossível não acertar
com os carros.
O meu sogro ia tão nervoso que não conseguiu evitar
nenhum dos buracos, mesmo os mais improváveis. Parecia uma viagem no alto mar,
em dia de tempestade.
Finalmente, saímos do Bairro, que não era da estimação
do Presidente da Câmara, por motivos políticos, e entramos na via que contorna
Lisboa, ligando a parte ocidental à oriental.
Logo a seguir ao acesso havia, então, também um grande
buraco, mas que qualquer condutor conseguia evitar se não fosse distraído ou
aselha, mas, não foi o caso.
Caímos no buraco, com estrondo. Eu senti-me, por
momentos, a levitar entre o assento e o tejadilho, aterrando, em seguida,
violentamente no assento.
Qual não foi o meu espanto quando, ao aterrar, percebi
que já não me doía nada.
No entanto, fomos à consulta. O médico fez-me alguns
testes e depois, coçando a cabeça, disse: o que descreve que sentiu é
compatível com uma pedra num rim mas, neste momento, não lhe posso diagnosticar
nada, porque nenhum dos testes me permite ter a certeza. Se era uma pedra, já
saiu do sítio em que estava presa. Portanto, nada há a fazer. Volte cá se tiver
dores de novo.
Efetivamente, era uma pedra no rim, não tive mais
dores, mas a maldita saiu dois dias depois, não sem dar um ar da sua graça,
pois a sensação foi, mais ou menos, como se me estivessem a espetar uma agulha
de crochet na uretra.
Concluí que se voltasse a ter tal coisa o melhor era
ir fazer um passeio de todo-o-terreno, para um local bastante acidentado ou,
alternativamente, pedir ao meu sogro que me levasse ao médico, pois estava
visto que era remédio santo.
Concluí, igualmente, que voos inesperados e aterragens
violentas são muito boas para a minha saúde.😂
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