E VIVERAM FELIZES PARA SEMPRE...


Os contos de fadas fizeram parte do imaginário de várias gerações. Invariavelmente as histórias terminavam com a união dos personagens principais, que, para além de belos e ricos, se amavam profundamente e que, a partir daquele dia, seriam felizes para sempre.


Nestes dias de vazio, em que nada me saía, não da pena, mas das teclas do computador, pensei, refleti, tentei organizar, de forma minimamente racional, a catadupa de pensamentos e sentimentos que se agitavam dentro de mim. Talvez não tenha feito descobertas originais, talvez não tenha visto a luz, talvez que este seja apenas mais um momento de pausa, mas, o que é facto, é que no sábado fiquei em paz. Uma espécie de descanso do guerreiro, após uma grande batalha.
Hoje senti, finalmente, vontade de escrever. Os meus pensamentos levaram-me às histórias fantásticas que povoaram  e povoam o imaginário das mentes infantis. Sejam elas de fadas, de super-heróis ou dos novos super-heróis importados das terras orientais.
Estas minhas reflexões levaram-me a uma constatação que me parece evidente: nós, enquanto simples humanos, nunca conseguiremos atingir a satisfação total e, portanto, enquanto vivermos a nossa vida terrena, estaremos sempre buscando algo mais, sendo, por isso mesmo, incapazes de viver felizes para sempre.
Talvez que as guerras, as grandes disputas, as discussões, as invejas e tantas outras coisas negativas das vidas dos humanos, afinal, sejam, principalmente e acima de tudo, causadas pela insatisfação dos Homens.
Às vezes cruzo-me, na rua, com pessoas que levam um misterioso sorriso estampado na cara e fico a pensar quais serão as razões que os deixam tão felizes.
E, foram estas reflexões, sobre histórias infantis, desejos secretos, sonhos de nos tornarmos heróis ou heroínas, de um qualquer acontecimento épico, e insatisfação, que me fizeram compreender como somos volúveis nos nossos quereres, como logo que alcançamos um objetivo, ele se torna em algo adquirido e com pouco interesse e, de imediato, arranjamos outro motivo de insatisfação, outro objetivo a perseguir, outra guerra a travar.
O que me leva a pensar que os misteriosos sorrisos, estampados nas faces dos que se cruzam comigo, não são mais que o resultado de uma batalha vencida, em direção ao objetivo final, do momento, da guerra pessoal de cada um deles.
Os objetivos podem ser grandiosos ou comezinhos, podem variar entre procurar criar algo em prole da humanidade e dos que mais sofrem; a conquista de um cargo profissional ou do homem ou mulher, que achamos ser o amor da nossa vida; a vitória sobre um rival; ou coisas tão prosaicas como a viagem de sonho, a compra dos sapatos, do vestido ou do automóvel que andamos a namorar, em uma qualquer montra, há um ror de tempo.
Talvez que, no fundo, a razão que está subjacente às histórias de fadas ou de super-heróis,  às nossas insatisfações pessoais, desejos inconfessáveis, lutas diárias ou paixões violentas, mais não seja do que a tentativa de alcançarmos o inalcançável, de nos testarmos a nós próprios e comprovarmos de que somos capazes de atingir o que nos propomos, por mais disparatado ou inverosímil que o nosso desejo seja.
Talvez que seja a procura do inatingível,  do supremo porquê da nossa passagem pelo mundo, da procura do nosso eu profundo e de um Deus que se materialize aos nossos olhos.
Até porque esta insatisfação permanente dos seres humanos só é aniquilada, ou pelo menos esbatida, quando estes se encontram em situações de extrema dificuldade, em que todas as suas necessidades básicas estão postas em causa, ou quando a sua saúde se debilita a níveis muito graves.
Somos reféns dos nossos traumas e frustrações, dos sonhos não cumpridos, dos desejos escondidos, dos amores frustrados, dos sonhos de glória ou poder; da nossa procura da razão de estarmos aqui e das razões para tudo o que existe dentro de nós e do que nos rodeia.  Somos reféns da nossa humanidade.
De onde viemos? Quem somos? Para onde vamos?
1897  - Mus. de Belas-Artes – Boston
Eugène-Henri-Paul Gauguin (Paris, 7 de Junho de 1848 - Ilhas Marquesas, 8 de Maio de 1903) foi um pintor francês do pós-impressionismo.

Mas, também, é essa mesma humanidade e essa mesma insatisfação que nos possibilita fazer coisas grandiosas e extraordinárias, evoluir, investigar, saber sempre mais e, acima de tudo, Amar, amar com loucura, amar insanamente. 
Saborear a vida, como quem bebe um vinho velho, num final de uma tarde de verão, com a natureza por paisagem, deveria ser a nossa máxima ambição. 

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