A fotografia que nunca tirei

Largo do Marquês - Porto Covo
3 de Setembro, cheia de bons propósitos saio, apressada,  da casa de férias da minha irmã, em Porto Covo. Conduzo, tão depressa quanto me é possível, pela estreita estrada junto às praias, entrando em seguida na labiríntica via rápida, em obras há uma eternidade, por força das obras que irão, num qualquer dia no futuro, dar origem à autoestrada que ligará Sines a Beja.
Praia Grande - Porto Covo
Consegui evitar todos os pinos sinalizadores  e deparo-me, quase inesperadamente, com a saída para Santiago, a qual, também em virtude das obras que se eternizam, se encontra, agora, muito mal sinalizada.
Este desvio para Santiago não estava no programa, mas precisei de  lá ir buscar os materiais para formação. 
Santiago do Cacém  - Antiga "Estrada do Algarve"

Santiago do Cacém Jardim e Câmara Municipal

Sigo, agora, confiante, para Grândola. Ontem, mesmo, deram-me as indicações que me permitiriam chegar, de forma rápida e segura, à Escola Profissional de Desenvolvimento Rural de Grândola. Mais eis que confundo as instruções e vejo-me agora numa estrada que não sei onde vai dar. Percebo que me estou a desviar de Grândola e a ir em direção ao mar.  A estrada é estreita, procuro um local seguro para fazer inversão de marcha. Retorno ao bom caminho e peço à primeira pessoa que encontro que me dê indicações do caminho para Escola.
Após mais duas paragens, para confirmar que estou no caminho certo, chego, por fim, ao local de destino. 
Escola de Desenvolvimento Rural de Grândola - Espaço circundante
 Os meus bons propósitos de chegar antes da hora, preparar a sala e receber as minhas formandas "fresca e deslumbrante" caíram por terra. Em vez disso, cheguei atrasada e afogueada, nervosa por ter de improvisar, justificar e tentar desfazer aquela má primeira impressão que damos, quando chegamos atrasados logo no primeiro dia de trabalho.
Escola - Instalações
 Observo, agora, 16 rostos de mulheres que me olham com alguma curiosidade, interrogando-se sobre quem será, como será, aquela formadora de meia-idade, com um bocadinho de peso a mais que, apressada e com algum nervosismo, tenta dar início à formação.  Mas, ainda temos algum caminho a percorrer antes disso.
Escola - Salas de Aula e Pátio
 A sala que me destinaram não é adequada para formação. Um pequeno anfiteatro, com filas de cadeiras com pouco espaço e sem suporte algum para se poder escrever, é o espaço físico  mais impróprio para uma formação. 
Faço então as diligências necessárias e lá conseguimos mudar para uma sala normal, mas, o data show não se consegue entender com o meu computador. Faço a cópia da apresentação de diapositivos para uma pen e transfiro para o computador disponibilizado pela Escola (dois dias mais tarde, terei que convencer o meu computador de que o data show é "amigo" e de que vão ter que se entender, pois o da escola avariou-se e começou a bloquear tudo).
Por fim, com mais de hora e meia de atraso, dou por iniciada a  formação e apresentamo-nos todas, enquanto fazemos o Jogo do Novelo. No final do jogo, o fio do novelo está emaranhado numa teia, a qual simboliza as relações que iremos estabelecer umas com as outras. Todas nos encontramos presas ao fio, com o qual demos um nó num dedo. Afastando o braço, puxo o fio preso ao meu dedo e toda a teia se mexe e os dedos das minhas formandas acompanham o movimento. Olho-as e, à laia de conclusão, peço-lhes que reparem que, agora que nos encontramos ligadas, todos os movimentos que cada uma de nós fizer, irão interferir com as outras.
11 de Setembro, último dia da formação, marcha lenta de Santiago até Grândola, primeiro "arrastando-me" atrás de uma retro-escavadora, depois um nevoeiro denso, compacto e húmido que me acompanha até me encontrar a 8Km do destino. Aí descobre-se um sol radioso perante os meus olhos cansados de tentarem ver através do manto pesado do nevoeiro.
Hoje, é dia de avaliação e também de almoço de despedida.  Hoje, é dia de nos dizermos adeus, mas, agora, já nos encontramos unidas por novos conhecimentos, gargalhadas e lágrimas.
Somos elos de ligação da grande corrente que forma a humanidade.
A área em que dou formação é a da Comunicação e, para, comunicarmos temos que ser assertivos, empáticos e praticar a escuta ativa. Temos que saber gerir e evitar conflitos. Temos que saber Acolher, Atender e Encaminhar. Temos que ser capazes de Comunicar de forma eficaz e para isso temos que receber um feedback positivo. 
Mas, não é possível, ou pelo menos eu não sei, transmitir estes conhecimentos sem "tocar" as pessoas, sem sentir o seu coração, sem lhes mostrar, na prática, o que é sentir empatia ou encontrar pontos de contacto.  Daí as gargalhadas, as lágrimas, a partilha, o despontar de novas amizades e a memória que fica...para sempre.
Almoçamos num restaurante, na Aldeia do Futuro. Gosto do nome da Aldeia, como sabem, gosto de sinais e este diz-nos, com toda a certeza, que vamos ter um Futuro e é em direção a ele que percorremos o nosso caminho.
Tinha o firme propósito de tirar uma fotografia do grupo, mas, esqueci-me desse propósito.  Assim, terei de guardar, dentro de mim, as imagens das memórias destes sete dias vivido com estes 16 seres humanos especiais. Mulheres maravilhosas, ou melhor, (nas palavras da Sónia, uma das minhas formandas) um Grupo de Mulheres Lutadoras.
16 desconhecidas, a 3 de Setembro, fazem hoje parte da minha vida, das minhas memórias. Deram-me novos conhecimentos e novas perspectivas de "ver". Deram-me histórias de vida. Reafirmaram a minha certeza na extraordinária riqueza que cada ser humano transporta dentro de si.
Disse-o, já, muitas vezes, mas nunca me cansarei de o dizer:  Gosto de ser mulher.  Gosto de ver mulheres unidas por laços de amizade, vivendo, partilhando, rindo, chorando, protegendo-se e dando força umas às outras.
Mesmo que esta seja uma semana marcada por novas medidas de austeridade e mais incerteza, para mim, a marca mais forte, mais importante e que mais pesará na minha vida, será a memória dos momentos em que, eu e as minhas formandas, nos formámos juntas.

Façam o favor de ser Felizes


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