O GRITO DA CORUJA - I Capítulo



A tarde ia a meio, o sol descia por de trás da serra e, lentamente, o manto negro das sombras cobria a encosta.
Estava frio, para aquela época do ano. O céu escurecia assustadoramente, as esparsas nuvens, que antes pairavam sobre a montanha, corriam, agora, velozmente, para o cume, avolumando a imensa massa cinzenta chumbo. Adivinhava-se chuva ou até tempestade.
O homem, de feições boçais e olhar estagnado, caminhava vagarosamente, sem destino aparente. O rouco grito da Coruja atroou os ares. Por um momento, o homem estacou, o seu rosto boçal contorceu-se num esgar de pavor, lançando-se em seguida numa corrida desordenada, como se não controlasse os próprios membros.
Ofegando, pesadamente, juntou-se a um grupo de gente que estava a trabalhar nas hortas.
Boas, Toino, foi murmúrio geral. Mas, Joaquim, que se encontrava mais próximo,  apercebeu-se do arfar ruidoso e da expressão aterrorizada do recém-chegado.
Ó Toino, parece que viste bicho! - exclamou Joaquim.
- A Cru.... cru... cruj...cruj,,, - gaguejou Toino.
Q'é que tu.. - ia Joaquim a dizer, quando foi interrompido por um novo e estridente grito de coruja.
Um pesado silêncio abateu-se sobre o vale.  Toino tremia convulsivamente e todos os outros pararam com o que estavam a fazer, entreolhando-se assustados.
Por aquelas bandas, era muito mau presságio quando se ouvia o piar da coruja durante o dia. 
Tanto quanto a memória das gentes conseguia recuar, o piar da coruja, durante o dia, tinha sempre antecedido as grandes tragédias. A morte do António das Moitas e de toda a sua família, num incêndio, do qual ninguém tinha conseguido descobrir a origem, e que, também, havia destruído floresta e culturas, para além de ter provocado a morte de um grande número de animais, era muito recente e ainda se encontrava bem viva na recordação de todos
As grandes cheias, a tempestade que destruiu casas e culturas e matou animais, o início da guerra, o assassinato da Maria das Fontainhas e dos seus bebés, eram apenas alguns dos dramáticos acontecimentos, de que todos se lembravam ou tinham ouvido falar, e, todos eles, tinham sido antecedidos pelo piar diurno da coruja.
O céu escureceu como se fosse de noite. A montanha pareceu rugir e uma chuvada violenta caiu, subitamente, fustigando os corpos cansados.

Foi a debandada geral. O estrondo da trovoada fazia tremer a terra, enquanto raios ameaçadores riscavam o céu, iluminando, por fugazes momentos, as gentes em fuga.


  



Corriam, agora, como que enlouquecidos, tentando alcançar a proteção de suas casas. No coração de todos a mesma angústia, na mente o mesmo pensamento.
Subitamente, estacaram aterrorizados. O ruído horripilante, do bater de umas enormes asas, sobrepunha-se ao barulho da chuva e dos trovões. 
O som aproximava-se perigosamente. O grupo juntou-se mais, sem saber o que fazer. Foi então que viram a enorme Coruja que voava, rapidamente, num voo baixo, em direção a eles.



O seu olhar faiscava de ódio. O grupo atirou-se ao chão, tentando proteger-se com as mãos.




Ao ruído aterrorizador das enormes asas em movimento veio junta-se um imenso grito rouco que quase os ensurdeceu.


- Fim do I Capítulo  -

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