Suicídio não é nem um direito, nem a violação de qualquer lei. Suicídio é dor e sofrimento

Fade in II  by Marko Beslac
Nota Prévia 

O tema suicídio é aqui abordado na perspetiva ocidental, pois, para algumas civilizações orientais, a conceção, entendimento, sentimentos e valores associados ao suicídio, poderão ser diferentes, em determinadas circunstâncias, em virtude da religião ou filosofia de vida próprias desses povos.
São disso exemplo o Haraquiri, um dos mais intrigantes e fascinantes aspetos do código de honra do samurai que consiste na obrigação ou dever do samurai se suicidar em determinadas situações, ou quando julga ter perdido a sua honra. Significa literalmente "corte estomacal". Esse suicídio ritual é também denominado seppuku, que é uma forma mais elegante de dizer exatamente a mesma coisa; o Kamikaze, nome dado aos pilotos de aviões japoneses carregados de explosivos que tinham como missão realizar ataques suicidas contra navios dos Aliados, nos momentos finais da campanha do Pacífico na Segunda Guerra Mundial; os Ataques Suicidas, o Jihad pela causa de Allah tem levado a que, voluntariamente, se entreguem à morte, em ataques suicidas, alguns muçulmanos, do Islão mais radical. Estes, de acordo com a crença islâmica, são considerados Mártires. "O Mártir vê o local que lhe é destinado no Paraíso, é isento do castigo do túmulo, não sente medo, é-lhe colocado uma coroa de esmeraldas pela honra que lhe cabe, terá a companhia de setenta e duas huris, e intercederá por setenta de seus parentes." "E não creiais que aqueles que sucumbiram pela causa de Allah estejam mortos; ao contrário, vivem, agraciados, ao lado do seu Senhor." (3ª: 169)

Este artigo também não é, exatamente, acerca do Suicídio Assistido ou da Eutanásia, os quais se encontram já legalizados em alguns países europeus e em alguns estados dos EUA, nem daquela que se encontra no polo oposto, a Distanásia, ainda que, como é evidente, não possam deixar de nele estar incluídos. 
Contudo, estes são temas de enorme complexidade, pois envolvem diferentes aspetos legais, técnicos, éticos, sociais, morais e psicológicos e não podem, nem devem, ser abordados de forma simplista, tendenciosa ou emocional, pelo que, ao serem analisados, devem constituir-se como tema central e não acessório.

Alguns Conceitos Importantes

Eutanásia - prática pela qual o médico abrevia a vida de um doente incurável de maneira controlada e assistida..

Suicídio Assistido - o próprio doente executa os procedimentos necessários para abreviar a vida, ainda que, para isso, disponha da ajuda de terceiros.

Paliativismo ou Cuidados Paliativos é o conjunto de práticas de assistência ao paciente incurável, através das quais se procura manter a dignidade e diminuir sofrimento, de forma tão eficaz quanto possível, dos pacientes terminais ou num estádio avançado de determinada enfermidade, ainda que esse a aplicação desse conjunto de práticas possa contribuir para uma morte mais rápida do paciente.

Morte Cerebral - o paciente torna-se cadáver, mas, em determinadas circunstâncias, pode ser mantido vivo, através de um complexo e dispendioso conjunto de meios de suporte de vida. O desligar das máquinas, nesta situação, não pode, portanto, para todos os efeitos, ser considerado eutanásia, uma vez que o paciente já não se encontra vivo, apenas os seus órgãos foram mantidos em funcionamento através de meios totalmente invasivos e artificiais.

Distanásia - prática pela qual se prolonga a vida de um doente incurável, através de meios artificiais, invasivos e desproporcionados. Também conhecida por "obstinação terapêutica". 

No way out-III - by Marko-Beslac

Nos dias de hoje, fala-se de suicídio com a leviandade daqueles que nunca sofreram a dor do suicida, nem a dor daqueles que perderam um familiar ou amigo que se suicidou
Fala-se de direitos, de leis, de estatísticas, de temas fraturantes. 
Fazem-se julgamentos, condenações e juízos de valor. Se uns olham o suicídio como um ato de coragem,  outro veem-no como uma cobardia e outros, ainda, como um momento de loucura.
Acontece que nada disso tem a ver com o suicídio, em si mesmo, mas, sim, com a forma como a sociedade, a religião, os políticos e as diferentes classes de profissionais o veem e contextualizam na sociedade contemporânea, com todos os seus preconceitos, crenças e dicotomias e à luz dos conhecimentos técnicos e científicos atuais.
Na verdade, o suicídio é feito apenas de dor e sofrimento, quaisquer que sejam as causas ou motivos que levam alguém a suicidar-se.
O suicídio é um ato profundamente solitário, o qual manifesta, de forma incontornável, que aquele que o pratica perdeu não só a capacidade  de suportar e lutar contra o sofrimento, mas, também, que perdeu a esperança de que poderá, de alguma forma, ultrapassar a situação e os fatores que lhe causam dor.
O suicida, na verdade, na grande maioria dos casos, não deseja morrer, mas só na morte consegue vislumbrar a solução para acabar com a sua dor.
Os familiares e amigos do suicida tendem a sentir-se culpados pela sua morte, mas, de facto, maioritariamente, pouco ou nada poderiam ter feito para o evitar.
Com isto não pretendo dizer que não devemos estar atentos aos nossos familiares ou amigos que manifestem comportamentos ou estados de espírito depressivos, desviantes ou perturbadores, mas acontece que a proximidade afetiva e emocional, aliada à falta de preparação técnica, normalmente, não permite ter o distanciamento essencial para a realização de uma análise objetiva da situação, nem agir da forma que seria a mais adequada.
O acompanhamento psicológico e/ou psiquiátrico e a medicação adequada são essenciais para a prevenção do suicídio, mas revelam-se, muitas vezes, manifestamente insuficientes.
Então, se a solução não está nem na mão dos familiares e amigos, nem dos psiquiatras ou psicólogos, o suicídio é uma inevitabilidade contra a qual nada se pode fazer?
Provavelmente alguns suicídios serão sempre inevitáveis, mas muitos outros não o serão. Penso que grande parte da solução se encontra exatamente no próprio suicídio, ou seja, na compreensão interiorizada desse fenómeno.
O cérebro humano é, ainda, um grande mistério para os que o estudam. A ciência já conseguiu compreender grande parte do seu funcionamento e dos seus "mecanismos". Mas, talvez não tenha ainda compreendido o essencial do porquê desse funcionamento, maioritariamente eletroquímico, para além de que ainda desconhece para que servem algumas partes específicas do cérebro. O conhecimento do porquê é o conhecimento da essência e só ela poderá dar as respostas fundamentais para o tratamento das doenças psíquicas ou dos estados depressivos, psicóticos ou outros.
Os motivos para o suicídio podem ser associados, entre outras coisas, a doenças mentais, a acontecimentos traumáticos, a problemas familiares, a perdas de entes queridos, a problemas financeiros e profissionais graves, a dificuldades de integração social, a perdas afetivas, a doenças graves, à solidão ou à velhice, mas, por si só, também elas não explicam completamente este fenómeno.

Come on, show me the end of the day - by Marko-Beslac


Em seguida partilho a adaptação do "The Student Counseling Virtual Pamphlet Collection" realizada por Carolina Ferreira, Psicóloga Estagiária no GAPsi - FCUL, a qual contem informação valiosa relativa ao suicídio e comportamentos associados.






“A ideia do suicídio é uma grande consolação: ajuda a suportar muitas noites más”



Suicídio


Os comportamentos suicidários constituem um flagelo da nossa sociedade contemporânea.

Contudo, na maioria dos casos, a pessoa escolheria outra forma de solucionar os problemas se não se encontrasse numa tal angústia que a impossibilita de considerar outras opções para além do suicídio. A intenção é geralmente parar a dor e não pôr termo à vida!

Acabar com os mitos!

Porque existem ainda muitas ideias erradas, importa desmistificar alguns mitos que existem na nossa sociedade acerca do suicídio.



MITO: “Tem que se ser louco para se pensar no suicídio!”

FACTO: De tempos a tempos, a maioria das pessoas tem pensamentos suicidas. A maioria dos suicídios e das tentativas de suicídio é feita por pessoas inteligentes, temporariamente confusas, que exigem muito delas próprias, especialmente se estiverem em crise.


MITO: “Apenas certo tipo de pessoas comete suicídio”.
FACTO: Todo o tipo de pessoas comete suicídio – homens e mulheres, novos e velhos, ricos e pobres, pessoas de meios rurais e meios urbanos; ocorre em todos os grupos raciais, étnicos e religiosos.

MITO: “As pessoas que falam sobre o suicídio não o cometem”.
FACTO: 8 de 10 pessoas que se mataram verbalizaram a sua intenção previamente.
Falar acerca do suicídio diminui o risco?
Estudos mostram que discutir pensamentos suicidas com alguém (p.e. familiar ou profissional de ajuda) pode ajudar a solucionar os problemas que contribuem para o pensamento suicida, contudo, não garante a redução do risco de suicídio.

MITO: “As pessoas que tentam suicidar-se estão apenas a chamar a atenção”.
FACTO: As pessoas que ameaçam ou tentam suicídio estão na verdade à procura de ajuda.
Considerar este comportamento manipulativo não diminui de forma alguma o potencial letal das suas acções.
As tentativas de suicídio seguidas de procura de ajuda não são sérias?
Embora possa existir ambivalência no suicídio (desejo de viver e morrer simultâneos), isto não garante que a situação esteja livre de risco. Importa lembrar que a maioria das pessoas que cometem suicídio dá um aviso prévio.
Serão as tentativas de suicídio apenas gritos de ajuda?
Se a tentativa de suicídio for encarada como apenas um grito de ajuda, pode falhar-se em perceber a gravidade do problema. Geralmente, uma tentativa representa mais do que um pedido.

MITO: “Uma pessoa que tenha tentado suicidar-se não volta a tentá-lo”.
FACTO: O oposto é frequentemente verdade. As pessoas que fizeram tentativas prévias podem estar em maior risco de cometer o suicídio; numa segunda ou terceira vez, as tentativas de suicídio podem parecer mais fáceis para algumas pessoas.

MITO: “Discutir ou questionar acerca do suicídio pode sugeri-lo à pessoa?”
FACTO: Discutir intenções suicidas com a pessoa de uma forma sensível e directa pode diminuir o risco de suicídio. A abertura e preocupação dos outros em perguntar sobre o suicídio a uma pessoa vulnerável, vai permitir-lhe experienciar dor ao falar no seu problema, o que pode ajudar a reduzir a sua ansiedade. Isto pode também permitir à pessoa com pensamentos suicidas sentir-se menos só e isolada, e talvez um pouco aliviada.

MITO: “Quando uma pessoa que tentou suicidar-se se começa a sentir melhor, o perigo acaba”.
FACTO: A maioria dos suicídios ocorre 90 dias após a melhoria do estado mental da pessoa.
A probabilidade de cometer suicídio diminui à medida que a depressão diminui?
Pelo contrário, à medida que a pessoa fica menos deprimida desenvolve mais energia psíquica e física, que pode ser focada no comportamento suicida.

MITO: “Se uma pessoa está seriamente a considerar suicidar-se, não há nada que se possa fazer”.
FACTO: A maioria das crises suicidas tem uma duração limitada e baseia-se em pensamentos confusos. As pessoas que tentam suicidar-se querem livrar-se dos seus problemas. No entanto, é necessário que se confrontem directamente com os mesmos para que possam encontrar outras soluções, o que pode ser feito com a ajuda de pessoas que as apoiem durante o período crítico, até que consigam pensar mais claramente.

A medicação pode parar o comportamento suicida?
Embora potencialmente útil para o tratamento a longo-prazo, a medicação pode não ser efectiva para a depressão imediata do paciente. De facto, alguns anti-depressivos (designados tricíclicos) podem mesmo ser letais em sobredosagem.

Sou um potencial alvo?
Conhecer o suicídio implica reconhecer os factores de risco. Destacam-se os seguintes:

Psicopatológicos – sofrer de depressão, esquizofrenia, alcoolismo, toxicodependência ou distúrbios de personalidade; estar sujeito a modelos suicidários: familiares ou amigos; ter tido comportamentos suicidários prévios; e demonstrar intenção suicida.
Demográficos – ter entre 15 e 24 anos ou mais de 45; pertencer ao sexo masculino; ter ocorrido a morte de pessoas significativas (p.e. pais, conjugue, etc.); ter escolaridade elevada; apresentar doenças terminais (HIV, cancro, etc.); E ter uma família desagregada (por separação, divórcio ou viuvez).
Psicológicos – desesperança (sensação de nada valer a pena); culpabilidade por actos praticados; e perda de pessoas significativas.
Sociais – habitar em meio urbano; estar desempregado; ter emigrado; ter falta de apoio familiar e/ou social; e ser reformado.

Importa, contudo, considerar que cada indivíduo lida com a tensão e o sofrimento de formas diferentes e a presença de múltiplos fatores de risco não implica necessariamente que a pessoa cometa suicídio. Na maioria das vezes, é a junção de alguns dos fatores supra mencionados que despoletam uma sensação de desespero suficientemente intensa para colocar a ideia de suicídio,
daí, ser importante estar atento aos sinais que as pessoas podem emitir em relação à ideia de poder pôr termo à vida.

Reconhecer o risco de suicídio envolve conhecer os sinais de alarme. Conhecê-los e intervir de forma eficaz é uma tarefa importante que poderá salvar vidas.

Alguns sinais de alarme que frequentemente são exibidos pelas pessoas deprimidas com intenção suicida são: sofrimento psicológico (tristeza intensa); perda de auto-estima; constrição (redução dos horizontes a um simples tudo-ou-nada); isolamento (sensação de vazio e de falta de amparo); desesperança; mudanças rápidas de humor; e egressão (fuga como única solução para acabar com a dor intolerável). Também a impulsividade é um dos factores importantes, pois ela modela a rapidez com que se passa do pensamento ao acto. Sinais como comentários acerca da morte ou suicídio podem expressar intenções suicidas e não devem ser desvalorizados. Os preparativos para a morte como escrever cartas aos amigos/familiares ou dar objectos pessoais de valor sentimental são, por vezes, um dos sinais mais preocupantes. Se forem detectados alguns sinais de alerta é importante não deixar a pessoa sozinha e procurar ajuda profissional.

O que fazer?
Considere-se a utilidade de algumas pistas sobre como DEVE reagir nesta situação:

• É importante levar a pessoa a sério, mantendo-se calmo e essencialmente escutando.
• Importa saber se a pessoa possui planos específicos e qual o método de suicídio que está a ser considerado.
• É igualmente importante não prometer confidencialidade, pois poderá ser necessário falar com amigos, familiares ou técnicos de saúde.
• Reconhecer os sentimentos da pessoa, oferecer confiança, ser empático e não crítico é fundamental.
• Realçar o facto de o suicídio constituir uma solução permanente para um problema que, ainda que parecendo irreversível, pode ter saída, lembrando a pessoa de que existe ajuda.
• Estabelecer um “pacto de não-suicídio” pedindo à pessoa que garanta que quando sentir vontade de se magoar não vai cometer suicídio, mas antes procurar ajuda (p.e. contactar alguém previamente acordado).
• Encaminhar e falar sobre a importância de ter o apoio de alguém com habilitações para o ajudar (p.e. médico ou psicólogo).
• Considerando que o suicídio é um acto tendencialmente impulsivo e que corresponde a um período em que a pessoa está mais confusa e fragilizada, é importante não deixá-la sozinha (p.e. junto de alguém familiar). Caso não exista essa possibilidade, deve ponderar-se a hipótese de internamento, que poderá ser contextualizada à pessoa, não como se algo de profundamente errado se estivesse a passar com ela, mas simplesmente como um modo de se proteger dela própria, enquanto a ideação suicida estiver activa.
• Não menosprezar o papel que certas crenças religiosas ou morais podem ter no desenrolar da situação. Certas pessoas podem ver nestas dimensões a última barreira a ultrapassar para cometer suicídio. Assim, devemo-nos aliar às “forças da vida”, e neste caso, promover uma empatia com as crenças da pessoa e utilizá-la em prol do objectivo: diminuir a probabilidade de a pessoa pôr termo à vida.

Importa lembrar que há sempre uma linha telefónica ou Número Nacional de Socorro 112, que funciona 24 horas por dia com pessoal habilitado na prevenção do suicídio que poderá ajudar.
Também os familiares ou amigos de vítimas de suicídio podem procurar ajuda nos “grupos de sobrevivência”, onde encontrarão pessoas com os mesmos problemas e experiências semelhantes à sua, onde não correm o risco de ser julgados e/ou condenados.

Para-suicídio

Arriscar morrer para sobreviver

Como nem todos os actos que parecem pôr em risco a vida do próprio correspondem a tentativas suicidas, convém distingui-los. Uma das principais diferenças é o nível de intencionalidade. Enquanto que a tentativa de suicídio é entendida como o acto levado a cabo por um indivíduo que visa a sua morte, mas que por razões diversas não é alcançada; o para-suicídio consiste num acto não fatal, através do qual o indivíduo protagoniza um comportamento invulgar sem intenção clara de morrer.
Ainda assim, arrisca danos a si próprio, através de comportamentos auto-destrutivos, muitas vezes com vista a conseguir modificações reais imediatas desejadas. Estes comportamentos relacionam-se com alguns comportamentos de risco, tais como o abuso de substâncias tóxicas, álcool ou psicoestimulantes; conduzir em excesso de velocidade, alcoolizado, drogado ou em contra-mão; vivência de uma sexualidade não controlada ou com relações de risco; escolha de alguns desportos “demasiado perigosos”; adopção de comportamentos mais arriscados tornando-se o próprio propício a distracções ou acidentes; alteração súbita de peso, na maneira de agir; etc.

Comportamentos de Auto-Mutilação

O desejo de silenciar a dor… Sem o desejo de morrer

Os comportamentos de auto-mutilação estão associados a um conjunto de perturbações emocionais e caracterizam-se pela prática de diversos actos que procuram provocar dor ou desconforto físico intenso. Embora alguns desses actos se aparentem com acções perpetradas por quem tem vontade de terminar a vida, não servem esse o objectivo, sendo utilizados métodos de baixa letalidade (p.e. cortes superficiais nos pulsos ou braços), que frequentemente deixam marcas visíveis que se procuram esconder. É importante estar atento a essas marcas, pois são pistas que podem ajudar a perceber que aquela pessoa precisa de apoio e até mesmo evitar situações acidentais em que a morte possa decorrer das suas acções, ainda que inadvertidamente. Estes fenómenos complexos são multideterminados e surgem, habitualmente, em situações de elevada ansiedade, tensão e fúria, tendo um elevado efeito tranquilizante que incita o indivíduo a repetir o gesto mesmo quando, após a auto-lesão, sente culpa e/ou vergonha. São as mulheres, em especial na sua juventude, que mais adoptam este tipo de comportamento, que constitui uma forma de lidar com o seu sofrimento psicológico – o controlo da dor física traz-lhes um sentimento de alívio relativamente à dor psicológica, transmitindo-lhes uma sensação de controlo sobre si próprias que não conseguem obter de nenhuma outra forma. Para essas pessoas, há que vencer a barreira da vergonha para procurar ajuda. Para quem vive com elas, há que tomar atenção e tentar perceber a diferença e que apoio será melhor – a sua detecção e encaminhamento pode evitar um gesto fatal, pois infelizmente, este tipo de comportamentos e situações nem sempre é descoberto a tempo.

Encontrar apoio

É nos momentos de crise e grande dificuldade, em que frequentemente todos pensam não haver qualquer solução e os próprios familiares e outros elementos de apoio sentem necessitar de ajuda, que a procura de apoio pode fazer toda a diferença, ajudando a pessoa a encontrar outras formas de viver.

SOS Voz Amiga
213544545
800202669

Telefone da Amizade
228323535

SOS – Serviço Nacional de Socorro
112

Se pretendes explorar o assunto, podes encontrar resposta para outras questões na Sociedade Portuguesa de Suicidologia 


Kazimir - by Marko-Beslac

Dados Estatísticos - A Análise Possível


"De uma forma sintética, pode dizer-se que a estatística é um conjunto de técnicas apropriadas para recolher, classificar, apresentar e interpretar conjuntos de dados numéricos.
Assim, a estatística constitui-se fundamentalmente como método e não como uma teoria, pois o seu objetivo é descrever os fenómenos e não tanto explicá-los.

Como a estatística é um ramo de matemática aplicada, os seus métodos são rigorosos e precisos. Apesar da objetividade que a matemática confere aos métodos estatísticos, deve ter-se em conta que os seus resultados incorporam alguma subjetividade. Tal subjetividade resulta principalmente da qualidade das medidas e das observações, o que é particularmente crítico no caso das ciências sociais e humanas." in Estatística 
Os dados estatísticos revelam-nos factos quantificáveis, através de valores absolutos, valores percentuais, taxas, índices, etc., os quais podem ser analisados e comparados em função de diversas variáveis, como por exemplo, anos a que se refere, países, regiões, sexo, idade, grau de escolaridade, etc..
A análise destes dados permite-nos fazer inferências, retirar conclusões e realizar projeções relativamente aos mais variados fenómenos políticos, económicos, científicos, sociais ou humanos.
Contudo, não explica os fenómenos em si mesmos, apenas confere uma base quantificável ao estudo desses fenómenos.
Os dados estatísticos são, contudo, indispensáveis e fundamentais, para que se possa compreender as diferentes dimensões e variáveis que integram o fenómeno que se pretende estudar, no caso presente, o suicídio, mas para que seja possível analisar e compreender essa realidade, torna-se necessário cruzar estes dados com outro tipo de dados, os dados qualitativos, portanto, não quantificáveis, os quais contêm sempre um maior ou menor grau de subjetividade.
Por essa razão, diferentes investigações sobre uma mesma realidade, ainda que utilizando os mesmos dados estatísticos, nem sempre conduzem aos mesmos resultados ou conclusões, uma vez que estes dependem, também, dos métodos, critérios, objetivos e objeto da investigação, da escolha dos dados estáticos a analisar, do género de dados qualitativos usados e até mesmo da subjetividade da análise do próprio investigador.
Os gráficos abaixo foram obtidos através da base de dados do INE, relativa ao suicídio em Portugal, de acordo com os critérios e variáveis indicados nos mesmos. As Tabelas, que lhes deram origem não são aqui apresentadas, em virtude da sua dimensão e da quantidade de informação que contêm, pois seriam de dificil leitura.
Nos Gráficos I e II apenas podemos visualizar a informação relativa a duas variáveis, as diferentes regiões de Portugal, em dois triénios, com um intervalo minímo de 9 anos entre ambos.


Gráfico I


Gráfico II


Da análise e comparação dos Gráficos I e II podemos concluir que entre o primeiro triénio, 2002 - 2003 - 2004, e o segundo triénio, 2011 -2012 - 2013, houve, de uma forma geral, uma diminuição de ocorrências e que as posições relativas entre as regiões foram mantidas.
As maiores oscilações verificam-se na R. A. dos Açores, na qual se pode observar um significativo aumento de ocorrências no ano 2011, relativamente à taxa média do primeiro triénio, voltando progressivamente aos valores anteriores, nos anos seguintes; na R. A. da Madeira, a qual sofre um aumento significativo de 2002 para 2003 e 2004, tendo uma das taxas mais elevadas, mas no segundo triénio é uma das regiões com a taxa mais baixa de ocorrências.
Em qualquer dos triénios, o Alentejo apresenta a taxa mais elevada e o Norte a taxa mais baixa de ocorrências. O Algarve, com taxas relativamente elevadas, é a Região que apresenta um comportamento mais irregular.



Gráfico III

No Gráfico III podemos observar a grande diferença, 8,4, entre a taxa de  suicídios praticados por homens e por mulheres, Homens 10,1 - Mulheres 2,6. 
Esta disparidade, entre homens e mulheres, é constante em toda informação consultada na Base de Dados do INE, desde 1990 até 2013. 



"A Sociedade Portuguesa de Suicidologia (SPS) foi criada a 16 de Dezembro de 2000, com vista ao estudo do suicídio e das condutas suicidas.

(…)a Sociedade Portuguesa de Suicidologia, tendo como objecto social a actividade científica, cultural e social, o aperfeiçoamento humano, organizativo, técnico, ético e de formação, a investigação, promoção e educação para a saúde, a concepção e a execução de projectos no domínio do estudo e investigação do suicídio e condutas suicidas."

As Tabelas III, IV e V são propriedade da SPS e podem ser visualizadas no seu site, clicando em Estatística.


Estatística

A SPS apresenta dados estatísticos, actualizados, sobre os comportamentos suicidários em Portugal e no mundo.

Tabela I
A Tabela I dá-nos a evolução dos valores do suicídio, em Portugal, entre 1996 e 2011, denotando um aumento do número de suicídios em 2002, o seu decréscimo nos anos seguintes, excetuando o ano 2004, e um novo aumento em 2010.
Esta Tabela evidência também a discrepância entre o número de suicídios dos homens e das mulheres.

Tabela II
A Tabela II é constituída por duas tabelas. Nestas podemos verificar as taxas de suicídios por sexo e idade e constatar que o suicídio aumenta em função da idade, com algumas exceções, aparentemente pouco significativas, na tabela do sexo feminino.
Podemos também verificar que, ainda que com valores inferiores ao dos restantes intervalos de idades, no intervalo 15-24 anos, também existe suicídio e que também neste idade ele é mais frequente nos homens/rapazes do que nas mulheres.


Tabela III
A Tabela III mostra-os a posição de Portugal (sombreado a verde), no que se refere ao suicídio, no geral e em relação aos homens e mulheres, em relação aos países Europeus e alguns outros fora da Europa. 
Portugal situa-se na metade inferior da Tabela entre os EUA e a Holanda, ocupando o 34º lugar, entre 45 países.
De acordo com a informação desta Tabela, os países com maior número de suicídios são a Lituânia, a Rússia e a Bielorrússia, ocupando respetivamente o 1º, 2º e 3º lugares da tabela, e os países com menor número de suicídios são a Geórgia a Arménia e o Azerbaijão, ocupando respetivamente o 43º, 44º e 45º lugares da tabela.
A disparidade, entre o número de suicídios dos homens e os das mulheres, tendo estes a primazia, é comum a todos os países constantes nesta tabela


Problem Solving - by Marko Beslac
Born identity - by Marko Beslac















Em jeito de Conclusão

Porque se suicidam mais os homens do que as mulheres?
Porque aumentam significativamente os suicídios nas pessoas com 65 anos ou mais?
Porque se suicidam os jovens?
Porque se suicidam mais pessoas no Alentejo do que em qualquer outra região do país?
Porque razão se suicidam mais pessoas na Lituânia, Rússia e Bielorrússia e o que faz com que o Azerbaijão a Geórgia e Arménia detenham as menores taxas de suicido de 45 diferentes países?
Nenhuma das respostas a estas questões é fácil. O suicídio é um facto de enorme complexidade e os motivos que a ele conduzem ou os fatores que os inibem prendem-se com questões psicológicas, psíquicas, genéticas, fisiológicas, familiares, sociais, religiosas, políticas, económicas, educacionais, geográficas, climáticas, de saúde, física ou mental, de solidão e isolamento mas, rara ou dificilmente se consegue estabelecer uma relação de causa e efeito que explique o fenómeno.
Será razoável pensar que o aumento dos suicídios, a partir dos 65 anos, se poderá dever ao facto de a saúde se tornar mais débil, o que poderá conduzir a situações de dor física permanente e a diferentes graus de incapacidade e/ou dependência. Acessoriamente, quanto mais velho se é, mais provável se torna que se percam entes queridos, que se esteja sozinho e que a esperança, de que melhores dias virão, se torne em algo sem sentido. Já não há lugar para realizar grandes projetos ou lutar por objetivos desafiadores.
O suicídio do idoso é, porventura, aquele para o qual é mais fácil encontrar uma explicação, ainda que muitos deles se agarrem à vida, mesmo em situações de grande sofrimento ou grande solidão e a ideia de suicídio nunca, verdadeiramente, lhes ocorra como uma solução ou objetivo.
Se é difícil compreender e explicar o suicídio, mais difícil se torna explicá-lo relativamente a uma região ou país específico, e mais ainda se essa compreensão e explicação se prender com análises comparativas e qualitativas, relativas a diferentes países.

O que me conduz a uma questão: - Se compreendermos um suicídio, conseguiremos compreender todos os outros? 
De certa forma, sim, pois compreendemos a dimensão da dor, da perda da esperança, da ausência de objetivos ou de objetivos considerados inalcançáveis pelo suicida, mas, por outro lado, não, pois apenas conseguimos compreender  essas dimensões e não todo o complexo processo que a elas conduz.
Se observarmos com atenção as fotografias de Marko Beslac,  que ilustram esta Conclusão, talvez, e só talvez, possamos começar a vislumbrar uma explicação para a existência de um muito maior número de suicídios de homens do que de mulheres.
Atentem na atitude da menina. Ela reflete, virada para dentro de si própria, procurando encontrar uma resposta, ou solução.
E o menino? Ele olha a parede, virado de costas para o mundo. As marcas das suas mãos, visíveis na parede, são uma busca de identidade, mas, de facto, a parede simboliza um obstáculo intransponível. Porque não se vira ele de costas para a parede e procura dentro de si ou no mundo a sua identidade? Porque o seu foco se encontra só e apenas no problema que tem em mente.
Os cérebros dos homens e das mulheres funcionam de formas diferentes e essa pode e deve ser uma das explicações para a discrepância do número de suicídios, entre homens e mulheres.
Mas talvez a explicação não esteja apenas no diferente funcionamento cerebral. Se viajarmos no tempo, perceberemos que, desde tempos ancestrais, a mulher tem uma relação mais próxima com o sofrimento e com a sua sobrevivência a esse sofrimento.
Desde logo, a maternidade obriga a mulher a aprender a suportar a dor física, por outro lado, na quase totalidade das sociedades, a supremacia dos homens sobre as mulheres coagiu-as a encontrar formas de se defender, criar zonas protegidas, tecer elaborados planos para alcançar os seus objetivos.
Mas e os jovens, porque se suicidam, quando ainda têm tudo por viver? Talvez que o encontrar de uma resposta para esta questão, seja o encontrar a resposta para o suicídio e para as soluções deste problema.
Se excluirmos as doenças psiquiátricas e as doenças físicas graves, resta-nos o suicídio "emocional".
Um jovem ou uma jovem suicidam-se porque não se sentem bem consigo próprios, nem com a sociedade em que vivem.
O que é fundamental para o equilíbrio psicológico e  emocional de uma criança, sem qualquer problema psiquiátrico, fisiológico ou físico grave?
O fundamental é sentir-se amada, valorizada, compreendida e integrada numa estrutura familiar e social que lhe sirva como referência. 
Não são só as famílias disfuncionais  que produzem crianças pouco equilibradas e jovens problemáticos.
A falta de atenção, falta de interesse, falta de amor ou a não valorização da criança, por parte dos pais, enquanto ser humano, com as qualidades e habilidades que detém,  e os ambientes familiares hostis, agressivos ou inseguros, produzem crianças mal resolvidas, com baixa auto-estima ou revoltadas.
Mas, por outro lado, os ambientes familiares excessivamente permissivos, onde existem poucos valores, morais, sociais ou educacionais, poucas ou nenhumas regras coerentes e onde  as crianças são habituadas a comportar-se como pequenos ditadores, que tudo exigem e a quem tudo é devido, também produzem crianças e jovens com pouco equilíbrio, os quais, ao confrontarem-se com um mundo que não está disponível para se render a todos os seus caprichos, desejos, quereres e exigências, produz, naturalmente, também crianças desajustadas, revoltadas e pouco equilibradas.
Se criarmos crianças que se sintam amadas e valorizadas; se lhes transmitirmos valores, tais como, a honestidade, a solidariedade e a responsabilidade; se estabelecermos um quadro de regras sensato e equilibrado; se lhes mostrarmos o Mundo, tal como ele é, sem o pintar de cor-de-rosa, nem o transformar em algo assustador ou sórdido; se proporcionarmos uma infância feliz às nossas crianças, elas terão muito mais probabilidades de se transformarem em jovens e adultos equilibrados, preparados para lidar com problemas, responsáveis pelos seus atos.
Qualquer jovem, adulto ou idoso que tenha como referência uma infância feliz e equilibrada estará mais apto a lidar com os problemas que a vida, inevitavelmente, lhe irá colocar.
Existem mecanismos, profissionais qualificados, técnicas e instituições que podem ajudar quer o potencial suicida, quer os seus familiares e amigos no combate ao suicídio. 
Para além disso, temos nas nossas mãos as "ferramentas" para proporcionar infâncias equilibradas às nossas crianças, sendo que, na sua larga maioria, não dependem da nossa disponibilidade financeira ou nível académico, mas antes da nossa sensatez e boa vontade. São estas mesmas ferramentas que podemos utilizar com jovens, adultos ou idosos. 
Temos, portanto, esperança e a esperança é o fator determinante para impedir o suicídio.

Reflexão

Iga - by Marko Beslac

O que te diz esta foto?
Estes olhos interrogam-te?
O que vês neles?
Esperança? Confiança? Felicidade?
Ou, apenas, uma pergunta incómoda?
Que fizeste TU, hoje, para tornar o Mundo num lugar melhor?
Que fizeste TU, hoje, que farás TU, amanhã, para que este olhar não se transforme em dor, em desencanto, em acusação?
Que fizeste TU, para que ELA possa crescer e viver em segurança?
Que fizeste TU, para que ELA não cresça num Mundo de ódio, violência, terrorismo, guerra, intolerância, cobardia, indiferença, acusações, fanatismo, divisões?
Que fizeste TU, hoje, para que ELA possa viver, amanhã?




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