O ANO DA MORTE DO JORNALISMO


Talvez eu não saiba exatamente localizar o ano da morte do jornalismo. Talvez a sua morte não passe afinal de uma morte anunciada.
Talvez que, no ato da conceção e nascimento do Acta Diurna, este já transportasse nos seu genes a sua própria sentença de morte, o seu servilismo, a sua dependência dos grandes e poderosos.
Johannes Gutenberg e a sua Revolução da Imprensa deram-lhe o adubo e oxigénio que lhe permitiu crescer e, posteriormente, a rádio e a televisão transformaram-no, dando-lhe novos formatos, maior alcance e mais poder. 
Nasceram assim os media, o famoso quarto poder. Estes ganharam uma ainda maior projeção, cobertura, qualidade e rapidez, através da utilização de satélites, para a divulgação da informação.
A Internet e a sua vulgarização foi, e ainda é, uma nova fonte de desafios para todos os media e para a imprensa de uma forma particular. Houve que reformular, repensar, inovar, transformar. Muitos, incapazes de se adaptar, acabaram por perecer. 
Afinal, agora, a informação instantânea, proveniente de qualquer lugar do planeta, tornara-se acessível a todos, sem que para tal fosse necessária a intervenção dos media, e o formato papel foi-se tornando cada vez menos apelativo para os consumidores de informação.
O jornalismo tem tido, ao longo dos tempos, um papel fundamental nas sociedades, quer pela divulgação da informação, local, regional, internacional, quer como fabricante, formador ou influenciador de opiniões.
O seu poder é tal que tem, deliberada ou acidentalmente, provocado ou contribuído inequivocamente para as mais profundas alterações da sociedade. 
Ao longo dos tempos, o jornalismo tem sido tanto rastilho para guerras ou revoluções, como aliado de regimes totalitários e, simultaneamente, o maior desmistificador ou denunciador da corrupção, abusos de poder, violência, fanatismo ou comportamentos desviantes.
O jornalismo pode assumir diversos formatos e géneros, obedece, ou deveria obedecer, a uma série de regras e tem uma ética própria, na qual a isenção e a veracidade dos factos se destacam como pilares fundamentais.
Contudo, os exemplos de mau jornalismo ou de más práticas jornalísticas são infindáveis, desde o veiculado pela denominada imprensa cor-de-rosa, que vive do sensacionalismo e da intromissão, muitas vezes, abusiva e indecorosa, na vida alheia; passando pelo sujeito à conivência ou dependência de grupos políticos, religiosos, económicos e outros, até à divulgação de informação gratuitamente escandalosa ou chocante, ou, ainda, de veracidade duvidosa ou tendenciosa, que, deliberadamente, omite factos, descontextualiza situações ou declarações de terceiros, culminando no fabrico de notícias, qual alcoviteira que espalha boatos.
O jornalismo é, cada vez mais, uma atividade competitiva. É preciso conseguir atingir um público cada vez mais exigente, mais conhecedor do mundo, com maiores habilitações e, com capacidade, ele próprio, de recolher e triar informação.
Para vingar, o jornalismo precisa ser extraordinariamente rápido e capaz de captar um público que já se encontra, diariamente, afogado com todo o tipo de informação.
Sobreviver tornou-se o imperativo máximo do jornalismo, transformando, em muitos casos, aquela que já foi considerada uma atividade nobre, no vale tudo, doa a quem doer, tenha as consequências que tiver.
Pouco depois de ter começado a escrever esta crónica, tomei conhecimento de um estudo recente, Precariedade e medo de perder o emprego condicionam jornalismorelativo às crescentes dificuldades com que os jornalistas se debatem. 
Esta é uma triste realidade, de um mundo em convulsão. Um mundo em constantes e rápidas transformações, onde, cada vez mais, o dinheiro e o poder ditam o destino dos homens, roubando-lhes a ética, os valores, os ideais e os princípios e conspurcando grande parte das atividades que, tal como o jornalismo, um dia, já foram consideradas nobres. 

Comentários

  1. Verdade. Aqui chamamos de imprensa marrom. Porque acho que de cor de rosa ela não tem nada...
    a internet, que era para ser algo maravilhoso, foi corrompida e usada para espalhar boatos. Triste...

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