O INFERNO


Pedrogão Grande ficará na memória dos portugueses, mas apenas dos que não têm memória curta.
Esta era uma tragédia, há muito, anunciada. 
Em 2003 também houve trovoadas secas. Para mim inesquecíveis. Sentia-as na pele e tiveram o condão de mudar, para sempre, a minha vida, mas, muito mais do que isso, mudaram a minha forma de estar na vida relativamente às florestas e aos terrenos agrícolas. Na verdade, mudaram a minha forma de estar na vida em relação a tudo ou quase tudo.
Até essa altura, acho que vi sempre os incêndios florestais como uma "coisa" que acontecia lá no Norte e era provocada pelos madeireiros. 
Seria um pensamento estúpido? Provavelmente, mas quando as coisas não nos tocam diretamente e sempre vivemos protegidos, temos tendência para não pensar muito nos assuntos e aceitar as coisas boas como dados adquiridos.
No dia em que vi arder, impotente, "parte da minha forma de vida", lembrei-me, mais do que nunca, do enorme exemplo que o meu Pai me tinha dado, mantendo perfeitamente tratadas, protegidas, desmatadas e com aceiros, todas as propriedades agrícolas que geria e tratava, as suas e as das suas irmãs e prima. Pois é, mas tratar e cuidar custa muito mais do que apenas usufruir.
Até ao momento, já pereceram 62 pessoas, no incêndio mais mortífero de que temos memória, no nosso país.  Por contabilizar encontram-se os hectares de floresta, sementeiras, plantações, ou hortas ardidas, o número de animais mortos, as alfaias agrícolas perdidas, as casas destruídas e o número dos que, para sempre, perderam o seu sustento e investimento de uma vida.
A culpa não foi do relâmpago que atingiu a árvore. Esse foi apenas o "fósforo" que acendeu o fogo. As terras por desmatar atearam-no, os aceiros sem manutenção ou inexistentes não o travaram, a má gestão da floresta e do espaço rural espalharam as faúlhas e a ausência de vigilância não o detetou atempadamente, fazendo com que os Bombeiros, em conjunto com a Proteção Civil e a população, travassem uma batalha desigual, incapacitando-os de controlar todas as frentes, incapacitando-os de estar em todos os lugares, em que eram necessários, ao mesmo tempo.
O abandono no meio rural
O FOGO E O VERÃO
2017 - VERÃO - ATÉ AGORA, 62 VÍTIMAS MORTAIS
As causas
O calor, a pouca humidade e o vento;
O aquecimento global, o efeito de estufa;
A má gestão florestal;
A falta de vigilância. Os Guardas Florestais e Cantoneiros foram extintos e não foram substituídos por nada, nem ninguém:
O abandono das terras;
O custo das desmatações - falta de meios financeiros e humanos.
Os incendiários;
Dizem que o fogo é um negócio. Será.
Mas o principal problema é a desertificação humana dos campos e a negligência por parte daqueles que têm o poder e os meios legais, económicos e humanos para manter florestas, matas e terrenos agrícolas limpos e desmatados.
Sem agricultores e silvicultores não há desmatação. O mato cresce descontroladamente e arde como palha seca.
O mato que arde como palha seca

Os poucos que ainda se dedicam à agricultura e silvicultura, como meio de subsistência e forma de vida, na maior parte dos casos, não têm meios financeiros ou humanos para fazer as desmatações.
Nas florestas e matas do Estado também as coisas não correm bem.
E se juntarmos mato, floresta, desertificação humana dos campos, calor, vento e trovoadas secas, negligência, negócios escuros e incendiários (a quem chamam loucos, para que possam ser inimputáveis) temos o fósforo, o rastilho, e o combustível que tudo destrói e mata.
Perdem-se vidas, no horror das chamas. Perdem-se casas. Perdem-se animais. Perdem-se árvores. Perde-se oxigénio e os teimosos ou demasiado velhos que ainda se dedicam à agricultura e silvicultura ficam sem forma de subsistência.
OS FOGOS DE VERÃO - EVITAM-SE E CONTROLAM-SE NO FINAL DO INVERNO E INÍCIO DA PRIMAVERA



Isto não é uma estrada, nem um caminho.
Isto é um aceiro ou "corta-fogo".
Para que serve?
Serve para tentar evitar que, em caso de incêndio, o fogo passe de um lado para o outro.
Serve, igualmente, para que os bombeiros possam mais facilmente chegar aos locais onde deflagram os incêndios.
Toda a floresta, todas as matas, todos os terrenos agrícolas devem ter aceiros, feitos pelos donos dos terrenos ou pelo estado, ou em cooperação uns com os outros.
O mato não cortado, desmatação, é o melhor combustível de qualquer incêndio.
Desmatar é igualmente obrigação de proprietários e do estado.

A gestão e fiscalização da floresta e do meio rural são uma obrigação do estado, em cooperação com os agricultores e silvicultores.
Extinguiram os Guardas Florestais, pois então mandem as Forças Armadas fazer a vigilância no verão.
Não há dinheiro para desmatar e fazer aceiros. Pois então, coloquem os presos a fazer esse trabalho. Afinal, a sua cama, mesa e roupa lavada, para além da manutenção dos edifícios, gastos de luz, água e gás e vencimentos de guardas e diretores prisionais são pagos por nós.

Para finalizar partilho uma publicação do meu amigo Jorge Ganhão na integra, texto e fotos, por concordar e subscrever a mesma.






Esta tragédia cruel e, única, até, no número de vitimas, trouxe-me, mais uma vez, à memória, o tempo dos Guardas Florestais (Os Anjos das Florestas).
Viviam, em casas, como as das fotos (agora abandonadas e, meio destruídas) e, cuidavam das nossas florestas, como se fossem deles. 
Quantas casas, quantas vidas, se teriam salvo, se não se tivesse extinto este corpo "militar", que foi criado, para cumprir o dever superior, de cuidar e, prevenir (??).
De certeza, que aquela estrada de «morte», teria sido cortada ao trânsito, a tempo!!!
Profunda Tristeza.


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