O DIÁRIO DO SILÊNCIO - Parte IV

Como poderão constatar pelas datas, não consegui publicar o meu Diário do Silêncio diariamente. 


Ainda que tenha iniciado e escrito quase toda a Parte III no dia correspondente, isto é, dia 22, não me foi possível conclui-la e publicá-la no próprio dia.
Demasiadas coisas para tratar, demasiado ruído mental e demasiado cansaço acabaram por me impedir de finalizar o artigo que só hoje, dia 25, publiquei.
Perguntar-se-ão  o que significa a imagem que escolhi para a IV Parte do Diário do Silêncio. Pois, bem, a resposta é bem fácil. É o arco-íris que nesta tarde de domingo entrou despudoradamente na minha casa, recostando-se numa das prateleiras do armário dos bonecos. 
O armário dos bonecos é um móvel de escritório, bastante antigo, da casa dos meus avós maternos. Nele, maioritariamente, estão expostos os meus bonecos, vestidos com os trajes regionais de diferentes zonas de Portugal e de vários outros países. Esta é a única coleção que jamais fiz. Durante anos, toda a família me trazia bonecos dos lugares para onde viajava, até que eu pedi para pararem, pois já não tinha onde os expor e sempre detestei esconder, ou arrumar em local inacessível, as coisas de que gosto.

Os meus bonecos são mudos, mas contam histórias, tal como o meu arco-íris me deixou uma história para contar.
As cores e luz que emitia eram tão fortes que, por um momento, me deixou completamente silenciosa, exterior e interiormente. 
Poderei interpretá-lo como um fenómeno natural, pela reflexão dos raios do sol no vidro do armário. Poderei interpretá-lo como um sinal divino, a reconfirmação da Promessa de Deus, da Aliança  e união entre o Céu e Terra, da renovação e da esperança.
A forma como sinto e interpreto o fenómeno não se prende nem com a explicação científica, nem com a palavra bíblica. Pois, na verdade, o que sentimos é inexplicável, naqueles instantes fugazes em que a distância entra o céu e a terra se extingue, em que tocamos a essência de Deus e somos banhados pela sua Luz, transcendendo-nos a nós próprios e  pairando para lá do mundo.
A experiência do silêncio foi extraordinariamente enriquecedora. Descobri que, para mim, faladora inveterada, afinal era fácil permanecer em silêncio. 
Uma aura de mistério envolvia-me quando saía à rua e as pessoas olhavam com estranheza para aquela mulher, eu, insonora, que parecia ouvir perfeitamente. 
Descobri que, afinal, sou capaz de conter as minhas emoções e pensamentos inflamados que, normalmente, se transformam em palavras que me saem da boca em catadupa e de forma incontrolável.
Descobri que o silêncio é um lugar pacífico, ainda que toda eu, nestes últimos tempos, viva mais tensa do que a corda de um violino prestes a estoirar, ou, quem sabe, do que como as minhas cordas vocais devem estar.
As noites foram difíceis e cansativas, sempre a acordar, as tardes silenciosas e ensonadas, mas tensas. No geral, os dias passaram devagar e inconsequentes. 
A expetativa, acerca dos vários assuntos que tenho entre mãos ou de outras situações que me preocupam e se encontram a aguardar resolução, sem que para tal possamos interferir, ficou-se por isso mesmo, tudo ou quase tudo continua ainda em aberto. 
Tanto ruído que tive que engolir em silêncio!!!! Muitas vezes os meus pensamentos ou aquilo que escrevia era tão intenso que ficava na dúvida se não teria de facto falado. Mas não. Os raros momentos em que me distraí, antes de estar autorizada a falar, foram situações "automáticas", de responder quando nos chamam e coisas similares.
Sábado, voltei a falar. Baixo, sem inflexões e durante pouco tempo.  A voz, ainda que num tom baixo, não sussurrante, parecia estar bem. 
E, inacreditavelmente, fiquei com pena de já poder falar.
O silêncio protegeu-me, ajudou-me a controlar emoções, fez-me compreender que afinal consigo controlar o que digo. Que afinal é possível ficar em silêncio.
O silêncio pode ser tantas coisas e assumir tantas formas. Pode ser uma proteção, uma barreira, um obstáculo intransponível ou ausência de empatia.  
O silêncio pode transformar-se num ruído ensurdecedor, num pesadelo, num fator destabilizador ou causador de enorme insegurança, quando não se recebe respostas às perguntas, às aproximações ou mesmo aos insultos. 
Mas o silêncio pode ser também o melhor caminho para alcançarmos a paz interior ou, pelo menos, para a procurarmos.
Julgo que, a partir de agora, serei uma mulher bem mais silenciosa. 





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